domingo, 29 de setembro de 2013

Nekromantik (Alemanha, 1987)

Filme: Nekromantik
Diretor: Jörg Buttgereit
Ano: 1987
País: Alemanha
Duração: 75 minutos
Elenco:  Bernd Daktari Lorenz, Beatrice Manowski, Harald Lundt 

Rob tem um emprego não muito convencional. Ele faz parte de uma empresa que faz limpeza em acidentes, removendo o sangue e o que sobrou dos corpos. Logo no início, começando bem o filme, ele e sua equipe já mostram serviço, após nos ser apresentado um acidente de carro, em que um corpo é cortado ao meio, ficando com as tripas expostas.


Mas Rob realmente trabalha com o que gosta, e leva o próprio trabalho para casa. Ele coleciona os restos humanos em sua casa, e tem seu mórbido gosto compartilhado com sua namorada Betty, que tem o saudável hábito de tomar banhos com sangue na banheira.


Certo dia ele encontra um corpo em decomposição em um pântano e o leva para casa. Com o novo souvenir o casal pratica uma sessão de necrofilia, inclusive adaptando um pedaço de madeira como o membro do amigo decomposto, acompanhado de uma música e câmera lisérgica, certamente tornando esta uma das mais bizarras e surreais cenas de um ménage à trois já vistas no cinema.

Instalando o novo acessório

Beijoca
Detalhe pra foto ao fundo

Enquanto Rob está no trabalho, Betty fica em casa lendo e se divertindo com o que restou do novo amante. Rob acaba perdendo o emprego e consequentemente Betty o deixa, mostrando ser uma "Maria defunto" mais interessada nos brindes trazidos por Rob do que por ele mesmo. Ela o deixa e leva morto consigo.

Para todos os gostos

Tristonho

Naturalmente Rob passa por maus momentos. Realmente não deve fácil ser trocado por outra pessoa, quem dirá alguém morto. Ele tenta suprir a falta de ambos primeiramente com o sangue de um gato morto, usado como essência para o seu banho. Mas isto não o satisfaz, ele precisa da morte para se sentir vivo, como quando está com uma prostituta em um cemitério, só conseguindo excitar-se após matá-la. Detalhe para a cena seguinte em que é surpreendido pelo coveiro, que tem sua cabeça cortada horizontalmente ao meio com uma pá, lembrando muito o Bad Taste de Peter Jackson, também de 1987.



Durante o filme, são exibidas cenas de um coelho agonizando enquanto é morto e dilacerado. Imagino que estas cenas não foram inseridas à toa, apenas para chocar, mas podem fazer um paralelo com o fetiche dos protagonistas e remetem à frase de V.L. Compton que inicia o filme: "O quê vive que não vive da morte de outros?"

O final é memorável e bizarro, onde Rob leva seus desejos aos limites mais extremos, sacrificando-se, através de uma facada na barriga, e conseguindo assim uma sangrenta ereção de seu pênis mequetrefe de borracha/plástico, enquanto é retrocedida a morte do coelho até o momento que está vivo. Desta forma, ele volta a ser notado por Betty, pelo menos é a impressão que passa ao vermos a cena que encerra a exibição.


Nekromantik é um filme único, retratando o amor, a morte, relacionamentos baseados em interesses, de uma forma nunca antes vista. Certamente pode ser considerado repulsivo, perturbador, imoral e doentio por muitos, por isto, não é para qualquer público. Tanto que sofreu muito com a censura, sendo proibido em muitos países, inclusive até hoje, fato pelo qual, o rendeu o status de filme cult. Para os já iniciados na vertentes mais extremas do horror, talvez não tenha tanto impacto, mas algumas cenas certamente ficarão na memória.

Jörg Buttgereit, defunto e Bernd Daktari Lorenz
A música tema, feita por sintetizadores, é interessante e marcante, mas um pouco cansativa, já que é repetida várias vezes durante o filme. Em nível de referência musical, também vale citar que o filme é homenageado pela banda de gore/grind patológico Haemorrhage, da Espanha, que coloca o tema do filme na introdução do seu primeiro CD, Emetic Cult, de 1995. Banda que por sinal tem muito a ver com o tema abordado no filme.

Nekromantik tem apenas 75 minutos e foi o primeiro longa de Jörg Buttgereit, que continuou retratando a morte nos filmes seguintes. Ainda em 1987 fez Corpse Fucking Art, um documentário sobre Nekromantik, em 1990, Der Todesking, em 1991 viria a sequencia de seu primeiro filme em Nekromantik 2 e em 1994, Schramm. Todos eles escritos juntamente com Franz Rodenkirchen.

domingo, 22 de setembro de 2013

Alucarda, La hija de las tinieblas (México, 1977)

Filme: Alucarda, La hija de las tinieblas / Alucarda
Diretor: Juan López Moctezuma
Ano: 1977
País: México
Duração: 85 minutos
Elenco:  Claudio Brook, David Silva, Tina Romero
IMDb: 6,0

Alucarda (Tina Romero) é enviada para um convento logo após sua mãe lhe dar a luz e morrer por forças do mal em uma capela.

15 anos depois, no convento cuja aparência é de uma sinistra caverna, as freiras aparentam usar trapos brancos ensanguentados, como múmias de saia, que mais adiante entenderemos do que se trata. Diferente delas, Alucarda, como boa filha das trevas que é, traja suas descoladas roupas pretas. 

Justine (Susana Kamini), uma jovem inocente, chega ao convento e logo torna-se amiga de Alucarda, e rapidamente a relação vai além de uma simples amizade. Elas vão àquela capela abandonada onde Alucarda nascera e abrem um caixão. Depois disso Alucarda passa a ouvir vozes das trevas. Mal conhecendo Justine, Alucarda já declara seu amor à ela e, com seus corpos nus, fazem um pacto de sangue transmitindo seu espírito satânico à Justine em meio à curiosa figura de um cigano corcunda que surge do nada (diabo?), gerando uma bela chuva de sangue, décadas antes do remake de Evil Dead repetir o feito ou anos antes do Slayer e seu Raining Blood.





Vemos cenas que contrastam o sofrimento e auto-flagelação (o motivo das roupas ensanguentadas) das freiras com a liberdade sexual e prazer do ponto de vista contrário à religião, ambas retratadas de forma um pouco exagerada.


Em uma missa, as duas confrontam a madre superior, questionando deus e suas regras. A primeira ação das freiras é puni-las. Alucarda é obrigada a confessar-se ao padre e diz que ama e valoriza uma vida livre, sem se privar de prazeres, ao contrário dele, que vive baseando-se na morte, fundamentando sua vida no medo, privação e castigo.

Ambas são amarradas em cruzes e é realizado um ritual de exorcismo. Neste procedimento acabam matando Justine. O Dr. Oszek (Claudio Brook, que também interpreta o cigano) intervém, e como homem da ciência, reprova estes atos desumanos, afirmando ser uma demonstração de ignorância e abriga Alucarda em sua casa. 
Há o confronto entre ciência e religião e o médico busca através da razão explicar os fenômenos. Mas, como a ciência nem sempre explica tudo, o médico, infelizmente, ao ver a cabeça de uma freira morta continuar movendo-se, alia-se aos religiosos para impedir que Alucarda possua a sua filha.


Na capela encontram Justine nua e banhada em sangue dentro de um caixão. Ela ataca uma das freiras fazendo jorrar muito sangue de seu pescoço. Não encontrando Alucarda no local, voltam ao convento.



< Spoilers >

O final é marcado pelo convento em chamas vindo abaixo enquanto as freiras correm desesperadas de um lado pra outro, muita gritaria, crucifixos em chamas e Alucarda, assim como a imagem de cristo, desaparecendo. 


< Fim dos Spoilers >

O filme foi uma adaptação livre de Carmilla, um conto de ficção gótica escrito pelo irlandês Joseph Sheridan Le Fanu e publicado na revista Dark Blue entre 1871 e 1872. Tratava-se de um história de vampirismo e erotismo e foi muito influente, até mesmo para Bram Stoker ao escrever Drácula em 1897 e teve também várias adaptações cinematográficas. 

O diretor Juan Lopez Moctezuma chegou a ser colaborador de Alejandro Jodorovski nos filmes Fando e Lis e o clássico cult El Topo. Seu primeira produção como diretor foi The Mansion of Madness, baseado em Edgar Allan Poe.

Alucarda aborda temas controversos e polêmicos, como possessão demoníaca, críticas religiosas, lesbianismo, ainda mais considerando a época em que foi produzido. É um clássico do cinema de horror e exploitation, podendo ser considerado de certa forma como um nunsploitation, subgênero do exploitation que transgredia os valores e a repressão sexual da igreja católica, com histórias passadas em conventos, repletas de erotismo envolvendo as freiras.

No geral é um bom filme, com boa fotografia interessante. Foi rodado em 1975 no México e nos Estados Unidos e uma curiosidade é que o filme foi falado originalmente em inglês, e depois dublado em espanhol para o lançamento mexicano.

Em 2010 foi lançado o filme Alucardos - Retrato de um vampiro, um documentário sobre dois fãs de Alucarda que tiram Moctezuma do hospital psiquiátrico que estava internado por sofrer de esquizofrenia e mal de Alzheimer, e o ajudam a relembrar de suas obras.

domingo, 15 de setembro de 2013

Dark Star (EUA, 1974)

Filme: Dark Star
Diretor: John Carpenter
Ano: 1974
País: EUA
Duração: 83 minutos
Elenco:   Dan O'Bannon, Dre Pahich, Brian Narelle


Dark Star é uma nave tripulada por uma equipe de quatro astronautas que é responsável por destruir planetas instáveis mas por descaso das autoridades governamentais, não teve implantado um escudo antirradiação, como informa, no início, uma transmissão vinda da terra. 

A nave, que viaja a incríveis velocidades, tem a capacidade de frear quase que instantaneamente. Assim, eles podem ativar e largar as poderosas bombas capazes de destruir planetas inteiros. 

Na rota da Dark Star aparece um grupo de asteroides unidos por um campo de força eletromagnético (leia-se, luzes azuis), e é preciso ativar o escudo de proteção, que é uma luz laranja piscante ao redor da nave. Por não ter aquele maldito escudo antirradiação, pouco a pouco, a nave vi apresentando defeitos, como neste caso, quando um setor é atingido. Isto acaba ativando a bomba, que não é lançada após uma discussão entre o sistema inteligente da nave e o da bomba até entrarem em acordo. Em uma transmissão, os tripulantes informam que outro setor foi destruído, acabando com o estoque de um item imprescindível: papel higiênico!


Mas é dentro da nave que se passa boa parte do filme. Inclusive a inusitada caça ao mascote do grupo, uma espécie de bola de praia vermelha com bolinhas e patas. Esta bola é bastante sacana e causa várias confusões ao escapar pela nave. Atrás dela, Pinback fica preso no fosso do elevador, e passando maus momentos ao ficar pendurado embaixo do mesmo. Depois ele consegue entrar mas fica com meio corpo entalado. Esta longa sequencia é bastante divertida, sobretudo se comparado aos momentos entediantes que os tripulantes precisam passar por não terem o que fazer, já que estavam há anos abandonados no espaço. 


O redondo alienígena continua aprontando e até então é a maior ameaça. Ele acaba por ativar mais uma vez a bomba, que novamente é impedida pelo sistema de inteligência artificial da nave, com sua voz feminina. 


< Spoilers >

Quando um dos tripulantes está tentando consertar um dos setores defeituosos, acaba por ativar novamente a bomba, que desta vez está decidida a explodir, porém, fica presa à nave. Os poucos minutos que antecedem a explosão causam desespero em todos à bordo. 
Nesta situação o comandante Powell, que é mantido congelado há anos, é acionado para dar conselhos de como proceder, mas ele está mais interessado em saber como anda o time dos Dodgers!


Doolittle resolve sair e negociar com a bomba, tendo uma conversa existencial com ela, questionando as ordens que recebe e o sentido de sua existência fazendo-a desistir para refletir sobre o assunto. 

Quando acionada novamente, a bomba, já pensando por si própria, se nega a aceitar as ordens e, achando ser deus, decide finalmente "fazer a luz", explodindo a Dark Star.
Doolitle ainda do lado de fora consegue capturar um dos restos da nave e, como se fosse uma prancha, vai surfando pelo espaço rumo a sua destruição.


< Fim dos spoilers >

Dark Star trata-se de uma criativa comédia de ficção científica. O filme nasceu como um média metragem de 45 minutos escrito por John Carpenter e Dan O'Bannon, colegas da Universidade do Sul da Califórnia. Mais tarde, a pedido do produtor Jack H. Harris (que produziu A Bolha Assassina de 1958), foi ampliado e lançado em 1974, sendo o primeiro longa metragem de Carpenter. 

Foi feito de forma quase artesanal, com improviso, equipamentos emprestados e filmado durante os fins de semana, somando apenas 60 mil dólares no total. Devido a este fator, hoje os seus efeitos parecem toscos e até engraçados, também em razão da época em que foi realizado.

Mas este é apenas um detalhe superficial que não deve ser levado a sério e não compromete o filme. Aliás, nada no filme deve ser levado a sério. Existem situações hilárias e absurdas e a sequencia final é ótima e até filosófica.

O elenco é bastante reduzido, se baseando quase que totalmente nos quatro astronautas. Um deles, Pinback, é o próprio Dan O'Bannon. John Carpenter faz a voz de Talby e também é responsável pela trilha sonora, coisa que ele faria seguidamente em seus próximos filmes. A própria música country "Benson, Arizona", que toca durante o filme foi composta por Carpenter.

O  roteiro possivelmente foi aproveitado para O'Bannon escrever o clássico Alien, o Oitavo Passageiro, em 1979. Ele também foi o diretor do ótimo A Volta dos Mortos Vivos, de 1985.
Já Carpenter, como muitos já sabem, dirigiu clássicos como Assalto à 13ª DP, Halloween, Fuga de Nova York, Christine, Eles Vivem, Enigma do Outro Mundo, entre outros. Sendo que os dois últimos citados são sérios candidatos a aparecerem aqui no blog.


Dark Star é um bom filme, quase esquecido dentro da filmografia de Carpenter, mas é uma boa mostra do ele poderia fazer, mesmo com orçamento reduzido.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Acción Mutante (Espanha, 1992)

Filme: Acción Mutante / Ação Mutante
Diretor: Álex de la Iglesia
Ano: 1992
País: Espanha
Duração: 90 minutos
Elenco:  Antonio Resines, Álex Angulo, Frédérique Feder


O filme se passa no distópico futuro de 2012, onde a polícia é opressiva e violenta com a parte mais pobre e feia da sociedade. Até aí não temos tanta ficção. 

Ação Mutante é um grupo terrorista formado por pessoas deformadas, deficientes e mutantes. Eles são vistos como o lixo de uma sociedade que valoriza em demasia a beleza e o corpo. Eles não querem cheirar bem nem serem magros neste mundo dominado por filhinhos de papai bonitos, anúncios de água mineral, cosméticos, aeróbica e todas estas bobagens. Cansados de tudo isso, o grupo ataca personalidades conhecidas pela aparência. Atrapalhados e pouco espertos, geralmente suas investidas de sequestro são mal sucedidas e acabam matando acidentalmente estas pessoas.


No início, após um das tentativas frustradas de sequestro, um programa de TV apresenta os integrantes e os crimes cometidos pelo Ação Mutante. O grupo é composto por gêmeos siameses, um sujeito sem as pernas que fica flutuando, o idiota com força sobre-humana, e Ramon, o chefe que acabara de sair da prisão. O filme realmente tem início com a divertida música da banda Def Con Dos em forma de videoclipe, com imagens do grupo terrorista.

Durante o seu tempo na prisão, Ramon planeja entrar na festa de casamento de Patrícia,  filha de Orujo, um milionário da indústria alimentícia, e sequestrá-la para pedir seu resgate.


Eles entram com o bolo de casamento como um cavalo de Troia, com um dos seus dentro do bolo. Após algumas trapalhadas, ocorre um massacre, matando praticamente todos convidados e conseguindo com sucesso realizar o sequestro.


< Spoilers >

Porém, as coisas não correm como o planejado. O ganancioso Ramon engana os demais, dizendo que o valor do resgate é 10 milhões, mas eles vêem na TV que o valor seria 100 milhões. Além disto, após a conclusão do sequestro, Ramon, assim como a sociedade, quer descartar os integrantes do grupo. Misteriosamente eles vão sendo mortos, servindo de comida para o selvagem e grotesco "gato" de estimação deles, ou sabotando-os, até que ele mata um dos gêmeos siameses. 


A nave é explodida por Orujo caindo no planeta Astúrias, local onde não existe mulheres, o que faz com que Patrícia seja disputada pelos habitantes do local. 
Alex, o gêmeo remanescente, irá buscar vingança e tentará conquistar o coração de Patrícia. Detalhe para o gêmeo morto que é descaradamente substituído por um cômico boneco que é arrastado de um lado para outro por Alex.


Por fim há o confronto com Orujo, o maluco ditador capitalista que não aceita pagar o resgate da própria filha, mostrando-se ainda pior que o próprio sequestrador. Ela mesma, conhecendo o pai, prefere ficar com o sequestrador. Tudo isto é televisionado como um espetáculo qualquer, com direito a apresentador. 

O filme termina de uma forma decepada e romântica após a ação violenta da polícia.

< Fim dos spoilers >


O filme tem um roteiro bastante original e criativo, criando um universo particular com lugares, medidas e moeda fictícios. É repleto de situações exageradas de humor negro e críticas, tanta para a ditadura da beleza, a mídia, a polícia, quanto para oprimidos que tornam-se opressores, tornando o filme sempre atual. Os efeitos são bem feitos, dispensando truques de computação gráfica, com um orçamente razoavelmente baixo, estimado em $ 2.5 milhões. Alguns elementos do filme lembram o estilo do cinema do holandês Paul Verhoeven, principalmente Robocop e Tropas Estelares.

Ação Mutante foi o primeiro filme dirigido por Álex de la Iglesias este que conta com a produção de Pedro Almodóvar. Álex dirigiu em seguida o ótimo O Dia da Besta (El Dia de La Bestia, 1995).

O título do filme também inspirou o nome da banda alemã de crustcore/grind Accion Mutante, muito boa, por sinal.

Mais um bom filme que não foi lançado no Brasil em DVD. Recomendo!