domingo, 27 de julho de 2014

Bagman: Profession Meurtier (Canadá, 2004)

Filme: Le Bagman - Profession: Meurtrier
Diretor: Jonathan Prévost, François Simard, Anouk Whissell
Ano: 2004
País: Canadá
Duração: 19 minutos
Elenco: Alain Bakayoko, Jimmy Beaudoin, Dave Bellerive, Jonathan Prévost, François Simard, Anouk Whissell
IMDb: 7,4

Um misterioso homem com um saco de pão na cabeça chamado Bagman sem motivo aparente, aparece e mata a todos que cruzam o seu caminho, afinal, esta é a sua profissão. E na tarefa de matar, o nosso "herói" não poupa esforços e usa seu vasto repertório de técnicas e armas para atingir este nobre objetivo, sem para isto, (quase nunca) usar armas de fogo. Ele dá o ar da sua graça após seu nome ser pronunciado três vezes (e nem precisa ser em frente ao espelho). 

A história começa em uma casa, após um aparente massacre, quando um dos sobreviventes chama uma garota escondida pensando que tudo tinha terminado. Tolo. Neste momento Bagman aparece com seu facão e corta o braço do sujeito (num efeito bem tosco) e em seguida, com mais um golpe divide a cabeça de sua vítima (em outro efeito bem tosco). A garota que estava escondida (nem tanto), por algum motivo consegue escapar. Este início não é tão bom quanto o que virá a seguir, portanto, não desista ainda.
Enquanto foge, ela é atropelada por uns gângsters e, após se recuperar, conta sobre o assassino mascarado implorando para que não mencionem o seu nome três vezes. Nada esperta ela. Bagman chega e começa o show! São chamados reforços para contê-lo, o que só faz jorrar mais sangue e aumentar a pilha de corpos.  Somente seus dois últimos oponentes lhe dão maior trabalho: uma atiradora de dardos e o chefão da gangue.





Seu arsenal de ferramentas, que ele tira de sua capa, além do já usado facão, é composto por duas machadinhas, que acabam parando nas nádegas de um de seus desafiantes; uma marreta;  facas; as próprias mãos para esmagar crânios ou arrancar testículos; ele também nos mostra novas utilidades para um guarda-chuva e ainda improvisa usando as tripas alheias como armas. 
Fica claro o baixo orçamento da produção, estimado em $ 2000 dinheiros canadenses, quando se nota o uso de bonecos, máscaras, bolsas de sangue nas mortes, mas que é compensado com muita criatividade, passagens cômicas, alguns clichês clássicos e uma incrível sequência de mortes que resulta em maior diversão do que muitos longas de maior orçamento. 



Bagman fez bastante sucesso na internet, onde era possível ver todo o curta no Youtube. O curta foi produzido pela Road Kill Superstar em 2004, inspirado em um personagem de uma história em quadrinhos criada por François e Anouk, dupla esta que também havia produzido um curta sobre o mascarado, chamado Bagman 2001. Acredito que uma das grandes inspirações foram os clássicos assassinos mascarados dos filmes slasher.
A Road Kill Superstar é um coletivo canadense de Quebec, formado em 2002 e composto por amigos que produzem curtas sangrentos, divertidos e de baixo orçamento, baseados no filmes trash/gore/exploitation dos anos 70 e 80, com grande influência da Troma e Peter Jackson do início. A equipe surgiu pequena, fundada por François Simard, Anouk Whissell e Jonathan Prévost, e depois também Yoann-Karl Whissell, estes que participam de diversas funções nas produções, incluindo a direção, além de serem atores recorrentes em seus curtas. 



Seu primeiro filme foi 2 Morts, de 2002, em seguida veio Bagman: Profession Meurtier, seu maior sucesso.
Outros curtas produzidos pela RKSS foram Chez Tony Spaghetti, Itsy Bitsy Grampy, La Roue Faucheuse, A Winner Is You, Total Fury, Kalashnipot e T Is For Turbo, curta que foi um dos mais votados para integrar a antologia The ABC's of Death, mas não chegou a ser o vencedor.  Também fizeram Red Head Red Dead, Ninja Eliminator I e II, que são espécies de trailers falsos no estilo dos grindhouse.
Devido ao sucesso de Bagman, a equipe chegou a ser convidada para trabalhar com Lloyd Kaufman no filme Poultrygeist, onde desenvolveram os storyboards e auxiliaram nos efeitos especiais.




Quem gosta de trash e gore já deve conhecer este curta, além de outros da produtora. Caso contrário, tem a obrigação de assistir esta viciante e divertida carnificina. Se tiver 20 minutos sobrando e quiser que sejam bem aproveitados, veja ou reveja Bagman!
Posso dizer que foi um dos filmes que me motivou a criar o blog e escrever sobre filmes trash, e já estava na hora de escrever algo sobre ele.

Todo curta está disponível no Vimeo da RKSS:


E também vale a pena conferir o making off:

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Pink Flamingos (EUA, 1972)

Filme: Pink Flamingos
Diretor: John Waters
Ano: 1972
País: Estados Unidos
Duração: 93 minutos
Elenco: Divine, David Lochary, Mary Vivian Pearce
IMDb: 6,1


Após ser considerada por um jornal sensacionalista a pessoa mais asquerosa do mundo, Divine é obrigada a se refugiar em um trailer com sua família, agora adotando o nome de Babs Johnson. Ela vive com seu filho delinquente, Crackers; a mãe doente mental, Miss Edie, que fica seminua em um cercadinho de bebê e é maluca por ovos; e a sua colega de viagens, Cotton, que adora espiar as transas de Crackers.


O casal Raymong e Connie Marble invejam Divine e brigam pelo posto de pessoas mais asquerosas do mundo. Para isso eles se esforçam bastante, mantendo mulheres em cativeiro que são fecundadas pelo seu criado, para vender os bebês à casais de lésbicas; tem lojas de pornografia e negócios com traficantes que atuam em escolas. 

Para demonstrar o nível deste pessoal, Divine tem o hábito de comprar carne e passear conservando-a entre as pernas. Enquanto isso, Raymond desfila faceiro com uma linguiça amarrada à sua linguiça, assustando as mulheres que vê pelo caminho, isso até não ser surpreendido por um transexual que responde mostrando-lhe o que tem debaixo da saia. 
O casal Marble busca por informações sobre Divine e para isso contratam uma espiã, que consegue um encontro com Crackers. Mas ela não imagina pelo o que a aguarda. Crackers a leva para o galinheiro e lá eles transam com uma galinha esperneando e sendo esmagada entre eles.


Já sabendo o endereço de Divine, mandam um belo presente a ela: uma caixa com merda! Como é aniversário de Divine, temos uma festinha com um show de bizarrices. Divine ganha lindos presentes como um cutelo, uma cabeça de porco e, para animar a festinha, música ao vivo e artistas performáticos, como uma mulher seminua dançando com uma cobra ou um homem que indescritivelmente acompanha a música com seus lábios anais! É ver pra crer! Os Marble ficam escondidos assistindo enfurecidos de inveja e chamam a polícia. A polícia chega, mas isso não é problema para a turma de Divine, que retalha e devora os policiais.


Divine e Crackers vão à casa dos Marble se vingarem. Eles lambem tudo na casa espalhando seus germes. Para aumentar a nojeira, Divine abocanha o bilau do filho. Enquanto isso, os Marble aproveitam para incendiar o trailer, mas, quando voltam para casa, são capturados e passam por um julgamento hilário em frente às câmeras da imprensa.

Naturalmente os Marble são julgados e sentenciados, não restando dúvidas de quem são os mais asquerosos do mundo! Divine não se acomoda com o posto e termina o filme em grande estilo comendo uma deliciosa e ainda quentinha merda de cachorro. E sim, ela comeu merda mesmo!

Fazendo uma boquinha

Pink Flamingos, de John Waters, é um clássico underground que transgride os valores morais do cinema e da sociedade tradicional americana. Uma obra-prima da contracultura, subversão e escatologia que tenta de várias maneiras chocar mas mantendo boas doses de humor negro. Vejamos algumas das coisas que aparecem por aqui: coprofagia, canibalismo, zoofilia, incesto, sequestro, tráfico de bebês, enfim, diversão para toda a família. Ao invés do belo, heroico e correto, temos o sujo, o asqueroso, o degradante e tudo que há de mau gosto. Uma gozação com a decadente comunidade hippie, pouco depois do julgamento de Charles Manson e sua turma, tanto que em certo momento é visto a pichação com os dizeres "Free Tex Watson", este que era um dos integrantes do grupo de Manson responsável pelos assassinatos. O filme ainda pode ser visto como uma sátira àqueles que fazem o que for necessário por fama, sendo produto para a imprensa sensacionalista. 



Sobre a última cena, em que Divine come as fezes do cachorro, Waters admite que foi apenas para chocar, pois, segundo ele, muitas coisas que não são ilegais podem ser chocantes. E isto é mostrado muito bem em Pink Flamingos. Lendo algumas críticas sobre o filme, vi que várias pessoas se ofendem mais com cenas de escatologia como esta, do que propriamente com os assassinatos que são realizados. Certa vez o diretor foi exibir o filme em uma prisão e foi acusado pelos detentos de tarado e pervertido, sendo que ironicamente eles eram estupradores ou assassinos.

Há também aqueles que se inspiram no filme e o diretor responde da seguinte forma:  "Às vezes as pessoas me escrevem e dizem que eu dei a elas coragem para fazer algo que eu provavelmente diria a elas para não fazer. Você tem que lembrar: são fantasias. Eu escrevo roteiros, eu não faço essas coisas.".

Com o pequeno orçamento de $ 10.000, John Waters, com 100 dólares conseguiu comprar o trailer em um ferro-velho e teve que puxar cabos de eletricidade por longas distâncias. Ele alugou ilegalmente o equipamento de filmagem de um canal de TV e ele mesmo filmou, talvez isto justifique a câmera amadora e cheia de zooms que vão e voltam, tecnicamente transgredindo os padrões do cinema de Hollywood.

O filme fez sucesso entre os Midnight Movies, filmes undergrounds da década de 70 que eram exibidos à meia noite (mesmo?), pois não tinham espaço no circuito tradicional. Pink Flamingos chegou a ficar em cartaz por um ano. Outros filmes que se destacaram naquelas exibições foram Eraserhead de David Lynch, El Topo de Alejandro Jodorovski, The Rocky Horror Picture Show de Jim Sharman e A Noite dos Mortos Vivos, de George Romero.
A trilha sonora é um espetáculo à parte, repleta de rockabilly e surf music dos anos 50 e 60 contrastando com as cenas grotescas de Divine e sua turma. Alguns dos nomes que integram a trilha sonora são Link Wray And His Ray Men, The Centurians, Lavern Baker, Little Richard, Bill Haley & His Comets, The Trashmen, entre outros. Esta trilha foi lançada em CD e vale a pena ir atrás dela, certamente algumas músicas terão outro gostinho ao serem ouvidas novamente.

Divine, a Drag Queen mais famosa e diva do cinema underground, fez vários filmes em parceria com John Waters. Sua primeira aparição foi em Roman Candles, de 1966, depois vieram Eat Your Makeup (1968), Mondo Trasho (1969), The Diane Linkletter Story (1970), Multiple Maniacs (1970), Female Trouble (1974), Polyester (1981), e Hairspray, de 1988, um de seus últimos filmes antes de falecer no mesmo ano com apenas 42 anos de idade.
Além de Divine, vários outros atores eram presença constante nos filmes de Waters, como o casal Marble (David Lochary e Mink Stole), Edie (Edith Massey) e Cotton (Mary Vivian Pearce).


John Waters, assim como Ed Wood, é considerado um dos diretores que mais representa o trash. Se formos analisar apenas suas maiores obras, Plan 9 From Outer Space e Pink Flamingos, pode-se notar que Ed Wood tentava e achava estar fazendo uma verdadeira obra de arte, mas que involuntariamente se torna trash por todos os seus defeitos. Já John Waters, sabe de suas limitações e faz propositalmente um filme o mais bizarro possível, sem se levar à sério e como um exercício de mau gosto, segundo o próprio. Isto nos prova como o trash pode ser algo abrangente.


Inspirado nas invenções de William Castle, Waters desenvolveu para os filmes Polyester (1981) e Female Trouble (1974), o odorama, um cartão onde os espectadores podiam interagir com o filme, sentindo os cheiros que os personagens sentiam.

Merecidamente, Pink Flamingos é citado no livro 1001 Filmes para ver antes de morrer, de Steven Jay Schneider.

Enfim, Pink Flamingos definitivamente não é um filme para todos, é preciso ter a mente aberta, não ser facilmente ofendido, não levá-lo tão à sério e talvez ter um pouco de estômago.

E para terminar, uma frase de John Waters:
“Para mim, mau gosto tem tudo a ver com entretenimento. Se alguém vomita assistindo algum dos meus filmes, é como ser ovacionado em pé.“.